03 de setembro de 2024

O que tem pra hoje?
O que tem pra hoje?
03 de setembro de 2024
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Sabe quando a gente entra no elevador e encontra alguém num contexto que há uma expectativa de interação? Se a gente não sabe o que falar, acaba fazendo qualquer observação sobre o clima e torce para que aquilo seja o suficiente para ocupar o tempo até que a viagem do elevador acabe. Né? O que tem pra hoje?

O que tem pra hoje é que está quente.
Só que nessa semana de setembro, na região sudeste do país, falar que está quente significa muitas coisas.
A gente está vivendo uma sequência de dias secos com temperaturas bastante altas que acabam vindo um pouco fora de hora, o que está causando uma série de problemas.

Mas não apenas isso. O clima está quente porque também estamos em período eleitoral e a disputa pelas prefeituras neste ano está pegando fogo. Falar, então, que o clima está pegando fogo pode ser algo bastante arriscado de se dizer num desses encontros de elevador.

Ainda assim, é o que tem pra hoje e eu vou falar disso porque precisamos conversar sobre a necessidade de sabermos navegar nesse mar de desinformação e cortes com falas descontextualizadas que estamos vendo o tempo todo e é isso que acaba embasando as decisões de muita gente na hora de escolher em quem votar.

É um assunto que dá quase tanto medo de falar quanto o calor e as mudanças climáticas. Só que precisamos falar de ambos.

Hoje, no entanto, o que tem pra hoje mesmo é o calor das discussões online e a fogueira da desinformação.

O contexto digital nos proporciona uma coisa muito legal que é o rompimento de um modelo unidirecional do fluxo de informações (principalmente notícias) que, na era da mídia de massa iam dos emissores (que existiam em pequena quantidade) em direção aos receptores (a massa). O digital transformou isso e agora temos múltiplos fluxos que vão em diferentes direções, uma vez que agora todos somos potenciais emissores e receptores ao mesmo tempo. Então os fluxos agora são de muitos para muitos. E são múltiplos fluxos. Uma confusão danada.

A gente foi vivenciando o desenvolvimento desse contexto tal qual um sapo em uma panela de água no fogão. A coisa começou a ferver e a gente não foi dando muita notícia. Agora a gente está a ponto de morrer cozido se não fizermos nada. Mas o que fazer? Eu vou dar aqui uma recomendação bem bacana de leitura que pode nos ajudar a enfrentar isso. O livro “Armas de destruição matemática” é um título muito importante escrito pela pesquisadora Cathy O’Neil. Infelizmente a tradução do título para o Brasil não ficou das melhores e o texto acaba se chamado “Algoritmos de destruição em massa“. Eu acho que esta tradução é inapropriada porque acaba por ajudar a distanciar a ideia do que são algoritmos das pessoas no geral. Mas enfim, né? Este texto da Cathy O’Neil é muito relevante porque ele trata de um aspecto bem importante referente à plataformização da comunicação que muito tem a ver com a disseminação de desinformação. A ideia de que as plataformas desempenham um papel muito importante no processo de disseminação de desinformação mesmo que este não seja a intenção inicial das plataformas. No entanto, a sua lógica de funcionamento acaba levando a este contexto.

Complementa a leitura deste texto o artigo “A relevância dos algoritmos“, do Tarleton Gillespie. Este texto também está traduzido para o português num trabalho muito legal dos professores Amanda Jurno e Carlos D’Andrea. Neste texto, Gillespie constrói uma descrição acertada de algoritmos que nos aproxima e facilita o entendimento do que Cathy O’Neil está falando. São informações que se complementam e que ajudam a gente a entender que os algoritmos são regras de trabalho das plataformas que servem a uma série de funções específicas isoladamente e, que, quando trabalhadas em conjunto, a gente tem máquinas de recomendação de conteúdo muito acertadas que acabam por estimular o espalhamento de conteúdos que não necessariamente se desdobrarão em ações coletivas muito felizes. Mas quanto a isso as plataformas não estão muito preocupadas; a função primordial de operar estes vários cálculos e regras é nos mostrar publicidade.

É angustiante, eu sei, mas saber como a coisa funciona é um primeiro passo para impedi-la de continuar funcionando. Nesse sentido a ideia é a gente tentar, individualmente, ser o ponto da rede onde uma informação errada para de circular. A gente precisa se educar novamente para aprendermos a consumir e circular conteúdos nas plataformas e fora delas. A gente precisa compreender que as máquinas de recomendação não se preocupam com a veracidade daquilo que estão recomendando, mas sim com a propensão das pessoas que verão aquelas postagens de ficarem mais tempo nas plataformas para verem publicidade.

Ou seja, para a gente, pessoas comuns, a disseminação de desinformação pode ter consequências catastróficas. Ainda mais em período eleitoral. Isso pode levar pessoas a votarem em gente que se dedica a enganá-las, colocando-se como a novidade e a anti-política ou o antissistema quando na verdade são justamente o contrário. Aqui, uma dica: a solução não está em se deixar levar pelo discurso antissistema ou antipolítica. A solução é justamente aprender e se informar para agir coletivamente e saber viver no contexto político.

O Instituto Palavra Aberta tem uma iniciativa bem legal nesse sentido que é o VAR – Verifique antes de Repassar. a ideia é super simples e é isso mesmo que você entendeu. Recebeu uma notícia? Qualquer notícia? Verifique se é real antes de repassar. Veja quem publicou e cheque quais são as credenciais desse veículo ou personalidade. Repasse apenas aquilo que tiver certeza que é verdade.

Nossa, muita coisa, né? Quase não está dando tempo de fazer outras recomendações. Mas eu não me sentiria bem se não as fizesse. Para dar uma relaxada e retomar as esperanças na humanidade, minha dica é voltarmos não 30 anos como ontem, mas sim 50 anos e irmos direto para 1974. Esse é o ano em que David Bowie lançou o disco Diamond Dogs, que tem a bela música Rebel Rebel. Este foi o ano em que o o Queen lançou seu segundo disco (Queen II) e que o Supertramp lançou o disco “Crime of the century” com a eterna música Dreamer. Mas o meu destaque para esta leva de recomendações é o quarto disco do Kraftwerk chamado Autobahn. Nossa, quanta coisa boa aconteceu em 1974, né? Meio século de excelentes canções.

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