Web 2. 0: Novas considerações

Novamente um post oriundo dos arquivos do blog. Desta vez uma releitura de uma coluna escrita para a Revista WWW em 2005. O post foi publicado no dia 18 de abril de 2009.

Quando o termo surgiu, lá em 2005, confesso que fui um dos primeiros a descer a lenha na conceitualização cunhada por Tim O’Reilly (para quem não lê inglês há uma versão traduzida do artigo original aqui. Mais definições aqui e aqui). Por um bom tempo eu sustentei a argumentação de que a coisa mais parecia um embuste de guru; sem validação e sustentação teórica.

Entretanto, confesso também que minha opinião mudou depois que comecei a refletir bastante em cima das propostas do texto (sim, demorou três anos para isso acontecer. Não se pode apressar algumas coisas e, embora a vida na web seja aparentemente mais rápida do que é no mundo “de verdade”, sem este tempo de reflexão e maturação, ao contrário do que se espera, a sociedade pára).

É importante ressaltar que várias coisas que li e que vi por aí na web não me ajudaram a mudar a opinião. Muito se escreve que a web 2. 0 traduz novos aplicativos e conceitos; o que não é verdade. Por isso que eu ajudava a entoar o coro de que o conceito era questionável (para ser bastante eufêmico). O que ocorre é que web 2. 0 não diz respeito a aplicativos ou a versões da web, como muitos acham que é e outros tantos  (como eu) argumentavam ser total non-sense.

Por isso resolvi escrever estas linhas para buscar uma melhor interpretação e compreensão do termo, que se refere muito mais a uma nova maneira de enxergar a web, e não de fazer a web necessariamente (embora uma coisa possa implicar a outra em grande parte dos casos).

Comecei a perceber isso quando lia e relia as argumentações de O’Reilly, onde ele diz que uma importante característica da web 2. 0 é que a informação agora volta e o UGC é peça-chave para o entendimento da web 2. 0. Quando eu lia e relia estas informações, menos entendia a web 2. 0, pois pensava (com razão): “Mas os fóruns e grupos de discussão são isso há um tempão e a wikipedia é, também bem anterior à web 2. 0; por qual motivo vir com este termo agora? por qual motivo tentar versionalizar algo que não tem jeito de ser versionalizado?”

O fato é que o cerne da questão não é a tentativa de versionalizar nada e nem mesmo de fazer explicações rápidas e isoladas. Da mesma forma que é bastante equivocada a argumentação de que o comércio eletrônico representa a “nova economia”*, é equivocado dizer que a web 2. 0 trata da web como plataforma, ou de aplicativos web usando Ajax ou ainda de “beta permanente”.

É mais do que isso. Web 2. 0 é uma nova (aí sim) maneira de enxergar a web e seu potencial, que sempre esteve lá, mas que somente depois de 10 anos de internet comercial começou-se a usar estas características já há tanto tempo identificadas. É novo porque ainda tem gente que trata a web como um simples canal de comunicação, o que não é bem a realidade. A web é um espaço onde coisas acontecem. Muito mais coisas acontecem neste espaço do que em canais de comunicação convencionais (a TV, o rádio e os jornais impressos, por exemplo, são canais de comunicação onde a informação trafega em apenas uma direção). Por isso é, também equivocado dizer que a web é “apenas” um canal de comunicação.

O conceito de web 2. 0 nos ajuda a enxergar isso. Neste espaço / ambiente em que se configura a web, não há hierarquia, influência do poder econômico e nem a necessidade de uma concessão do governo para enviar mensagens. Este rompimento de paradigma que nasceu com a web, mas que até 2004/2005 parecia estar hibernado, é o que realmente dá significado à web 2. 0. O suporte de aplicativos proporciona apenas (sem desvalorizar, claro) a estrutura para que isso ocorra com mais facilidade e acesso a um maior número de pessoas.

Mas por qual motivo falar disso agora?Bem, em primeiro lugar, pois eu não vi em nenhum lugar este tipo de explicação e fazer este tipo de esclarecimento me parce bastante oportuno no momento. Em segundo lugar, para deixar claro o meu entendimento da coisa a quem interessar possa.

Mas o mais importante motivo que me faz querer falar disso agora é que tenho visto muitas empresas que têm a faca e o queijo nas mãos para usar e abusar da web 2. 0 e se beneficiar bastante com isso, mas escolhem um caminho que pode não ser muito legal. Citarei três (para não deixar este post ainda mais longo) exemplos de empresas que em pleno ano de 2009 parecem não ter sacado o conceito (viu como eu não demorei tanto?) de verdade.

Para exemplificar e analisar a coisa com o mínimo de rigor metodológico, escolhi empresas de varejo. Tomo com referência para as observações a Amazon que faz uso de algumas premissas do conceito de web 2. 0 com bastante êxito. Para não deixar as análises ainda mais longas, focarei em apenas uma premissa: participação do usuário. Assim fica mais fácil tecer os comentários.

Pensemos no nosso exemplo (Amazon) e observemos como a coisa funciona lá em termos de participação dos usuários. Na Amazon, os produtos podem ser comentados pelos consumidores e avaliados por eles. Para evitar fraudes (registradas), os próprios usuários têm seus comentários avaliados pelos outros usuários. Um comportamento bem condizente com as premissas da web 2. 0 (conteúdo gerado pelo usuário e criação de espaços de comunicação / interação entre as pessoas ao invés de apenas “entregar” informações). Com esta iniciativa, a Amazon permite que sejam criadas comunidades em sua loja. As pessoas ficam mais tempo no site e recebem auxílio de outros consumidores para tomarem suas decisões; afinal, a opinião de outra pessoa como eu vale muito mais pra mim do que a opinião do vendedor. Além disso, é fornecido ao consumidor a possibilidade de trocar idéias sobre os produtos em um fórum de discussão com acesso imediato, logo na página do produto. As conversas que vi nestes espaços vão além da recomendação de um produto ou sua avaliação e rumam para a colaboração efetiva entre os consumidores: um consumidor ajudando outro que tem dúvidas sobre o uso de um produto específico, por exemplo.

Ou seja: a aplicação de alguns princípios simples implicou em uma série de benefícios para a empresa. eu mesmo já me vi comprando produtos na Amazon não por outro motivo senão a recomendação de alguém. Isso não acontece facilmente em uma loja tradicional (física) e muito menos nos exemplos brasileiros.

  1. Casas BahiaUma pena que o maior varejista do setor no país tenha iniciado sua operação na web apenas em 2009. O atraso, entretanto, poderia ter proporcionado às Casas Bahia uma entrada triunfante na web brasileira. Afinal, não é todo mundo que pode se dar o luxo de começar do zero uma frente de vendas na web em plena era da web 2. 0.   Só que o que aconteceu foi o lançamento de uma loja bem, digamos, web 1. 0. Não há nenhum tipo de recurso que passe perto da possibilidade de avaliar um produto ou deixar meu comentário. A coisa mais perto disso (embora esteja bem distante, deve-se dizer) é a funcionalidade de mandar um e-mail a alguém com um link de um produto.
  2. Magazine LuizaO pioneiro do comércio eletrônico no Brasil ficou prá trás na web 2. 0. Aqui também há apenas a possibilidade (bem escondida, por sinal) de enviar um e-mail a alguém com um link para um produto. A possibilidade de interação pára por aí. Interação, então, nem pensar.
  3. SubmarinoA empresa que é sinônimo de vendas pela web no país parece ser a única que oferece esta funcionalidade, embora muito pouco explorada. Ao final das páginas dos produtos, é possível avaliar o produto e colocar uma opinião sobre ele. Mas a coisa pára por aí. Embora possa parecer bastante se comparado aos outros players brasileiros, o que temos aqui passa longe do que seria um pleno uso das possibilidades que podem ser exploradas com este tipo de funcionalidade. Além disso, esta possibilidade não é muito trabalhada junto aos consumidores. Ninguém se sente estimulado ao comentar sobre um produto e o caminho para isso não é muito claro (aposto que tem gente que compra regularmente na loja e nunca viu isso). Então… Apesar de ter algum tipo de ferramenta que pode ser bastante aproveitada, o Submarino perde muito ao não dar destaque a esta ferramenta e ao não incentivar o usuário a utilizá-la plenamente.

Então… Se alguém teve a paciência de ler até aqui, é hora de agradecer e concluir, certo?

Pois bem… É legal então ver que o conceito de web 2. 0 é muito mais amplo e interessante do que o uso da web como plataforma e certamente refere-se muito mais a uma mudança de comportamento ao enxergar a web do que uma palavrinha da moda.

Talvez por causa da interpretação errônea do conceito temos visto muitas empresas ignorarem alguns princípios bem interessantes e que podem ser bem vantajosos tanto aqui no Brasil quanto lá fora (aliás, este é outro conceito que devemos aprender a repensar… com a web, não existe mais “aqui” e “lá”, mas isso deve ser assunto para outro post).

*Vale explicar que esta abordagem é equivocada pois embora tenhamos alterações substanciais no composto de marketing, por exemplo, a virtualização do comércio não faz o suficiente para ser atribuído a este processo o título de “nova economia”; afinal, pessoas continuam trocando bens e serviços por dinheiro ou outros bens e serviços. Isso não é nada novo. Apenas o balcão mudou, não a economia.

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